A Responsabilidade Criminal de Pessoas Colectivas no Ordenamento Jurídico-Penal Angolano
A presente obra expõe reflexões sobre a responsabilidade criminal das pessoas colectivas. Ao falarmos de pessoas colectivas, estaremos tão-somente a referir-nos às pessoas colectivas de direito privado, com o fundamento de que haveria uma incongruência gritante se tivéssemos de punir, por exemplo, o Estado, único titular do poder punitivo.
Com a introdução, no artigo 5.º n.º 2, da Lei n.º 3/14 de 10 de Fevereiro, Lei sobre a Criminalização das Infracções Subjacentes ao Branqueamento de Capitais, que de forma inovadora veio responsabilizar criminalmente as pessoas colectivas, propusemo-nos a confrontar os artigos 65.º da Constituição da República de Angola e 26.º do Código Penal (revogado pela Lei n.º 38/20, de 11 de Novembro), que admitem a responsabilidade criminal no seio das pessoas físicas sem referência às pessoas colectivas.
Pretendemos, de forma clara, defender a admissibilidade da responsabilização criminal das pessoas colectivas, considerando que hoje em dia são as empresas ou entes colectivos, no geral, que, em determinadas áreas específicas da criminalidade, como a económica e a ambiental, mais praticam crimes e, principalmente, mais danos causam.
Dos danos causados pelo ente colectivo resultou uma profunda reflexão sobre a necessidade de, no âmbito do Direito Penal primário, se poder responsabilizar criminalmente uma pessoa colectiva e reflectir criticamente sobre o conceito de culpa penal para, a partir daí, apontar os fundamentos da sua aplicação às pessoas colectivas.
No entanto, tal tarefa não será fácil, uma vez que contra a ideia da responsabilidade criminal das pessoas colectivas alinham-se vários argumentos tendentes à afirmação do clássico princípio societas delinquere non potest.
Apesar dos argumentos contrários à admissibilidade da responsabilidade criminal das pessoas colectivas não desistimos. Isto porque, se no domínio do Direito Penal primário nos limitarmos a punir apenas os executores, isto é, as pessoas físicas que agem em nome da pessoa colectiva, não lograremos os fins de prevenção especial e geral, uma vez que aquele que claramente beneficia com a prática do crime sairá impune. A nosso ver, esta não parece ser a posição mais adequada, pois traduzir-se-ia num tratamento privilegiado das pessoas colectivas em detrimento das individuais, o que criaria vazios de punibilidade.